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A era dos drones autônomos chegou. Estamos preparados?


No último dia 31 de maio, a revista norte-americana TIME, uma das mais conhecidas e influentes do mundo, chamou a atenção por ter reproduzido a sua icônica capa usando 958 drones. Cada equipamento carregava uma lâmpada vermelha, que é a cor característica da revista, e os quase mil aparelhos voaram em sincronia para formarem a clássica capa com a borda vermelha e a palavra TIME centralizada no topo, a mesma utilizada há décadas para destacar a "pessoa do ano".

Foto: Reprodução/

Todo esse forço não foi por menos. Os drones, de fato, prometem diversas revoluções nos próximos anos. Aliás, o termo "promete" sugere algo para o futuro, mas a reportagem especial da revista é justamente sobre como os drones já não são mais promessas. Eles já estão criando reviravoltas em diversas esferas, como no cinema, nas atividades militares e na logística.

Em 2016, a PricewaterhouseCoopers, uma das três maiores empresas na área de auditoria e consultoria da atualidade, publicou a pesquisa "Tech Breakthroughts Megatrends", em que analisou 150 inovações tecnológicas e selecionou as oito com maior potencial de transformação nas empresas até 2020. Os drones ficaram em 4º lugar, à frente das impressoras 3D, da realidade virtual e até mesmo dos robôs.

Para nós, pessoas comuns que não convivem com drones, fica difícil entender o porquê de um pequeno helicóptero ter tanto potencial assim. Só por que ele pode carregar coisas? Isso seria mais impactante que impressoras 3D, realidade virtual e robôs?

UNIÃO DE TECNOLOGIAS
O que a gente não percebe é o que, de fato, não dá para enxergar a olho nu: mais importante do que as diversas mini-hélices que sustentam o corpo do equipamento, o que realmente dá o potencial de tanta transformação é o conjunto do drone com os sensores, o microprocessador e, principalmente, com a inteligência artificial (IA). Aliás, a IA ficou justamente em 1º lugar na pesquisa "Tech Breakthroughts Megatrends".

Entre os sensores carregados pelo drone, o que mais conhecemos é a câmera. A união dos dois faz com que o drone substitua o cinegrafista, a grua (aquele suporte de metal longo utilizado para carregar e movimentar a câmera de vídeo pelo ar) e até o helicóptero (sabem aquelas gravações aéreas de protestos urbanos, animais selvagens em savanas, esquiadores em montanhas e penhascos?).

Encontrei algumas entrevistas com profissionais da área dizendo que o drone está provocando uma revolução na forma de captar as imagens no cinema. Imagino que não é só o cinema que se transforma com isso: poderia citar ainda os documentários, a publicidade, o telejornalismo e as pesquisas biológicas e geográficas que exploram grandes áreas naturais.

Além das câmeras, os drones podem carregar ainda mais sensores: os de aproximação e colisão, os que detectam luz, os que medem temperatura, os de mapeamento e sensoriamento remoto, os de comunicação (com as pessoas, a com a internet, com objetos, com outros drones), entre tantos sensores que surgem todos os anos.

Agora, imagine a potencial que surge ao unirmos os drones, os sensores, o processamento computacional e a inteligência artificial. É uma mistura tão poderosa que, particularmente, chego a ficar com bastante receio. E já temos exemplos reais de aplicação dessa mistura que demonstraram tanto o potencial transformador para o bem quanto para o mal.

POTENCIAL BENÉFICO
Vou começar com o potencial benéfico da união dos drones com outras tecnologias avançadas. Além das pequenas revoluções na captação de imagens, como já tratamos no início desse texto, podemos citar as vantagens no uso dessas tecnologias que envolvam logística e exploração.

Em uma breve busca por notícias e relatos publicados nos últimos meses, encontrei diversas aplicações reais que justificariam a intensa pesquisa que é realizada nessa tecnologia. E o mais interessante é que as aplicações são realizadas em diversas partes do globo. Cito apenas algumas das que encontrei:

- Nos EUA, equipes de inspeção de infraestruturas estão utilizando drones para vasculhar constantemente por possíveis problemas nas redes de transmissão de energia, nas extensas tubulações de petróleo e gás natural, nas estações de geração de energia solar e eólica. O "drone fiscal" consegue inspecionar não apenas uma área plana extensa, como também o topo dos postes, plataformas e torres dessas estruturas.

  • Australianos estão usando drones para acompanhar grupos de baleias em mar aberto e coletar partes da água ao redor dos animais para analisar a presença de vírus que podem afetar não apenas as baleias, como também os humanos.
  • A Agência de Aviação da Finlândia está testando com sucesso o uso de drones no controle e gerenciamento de tráfego aéreo nos aeroportos do país.
  • No México, a simples presença de um drone no céu fez diminuir o número de crimes em 10%. Os roubos a residências diminuíram em 30%.
  • No Estado de Nova York (EUA), foi aprovado um programa governamental para investimento de drones com câmeras de temperatura que auxiliarão os bombeiros a identificar focos internos de fogo e a combater incêndios em grandes prédios.
  • Também em Nova York, uma empresa passou a utilizar com sucesso os drones para substituir as abelhas no processo de polinização de plantações de maçã.
  • Na China, a gigante do varejo digital Alibaba está fazendo entregas de produtos com até 6Kg dentro da cidade de Shangai. O tempo médio de entrega já caiu para apenas 20 minutos. Além disso, deixam de contribuir com mais congestionamento no trânsito. Um dos planos da empresa é expandir para regiões rurais.
  • Em Ruanda, na África, uma empresa norte-americana testa o uso de drones na entrega rápida de sangue para hospitais de áreas remotas do país, já que tais regiões não possuem bancos de sangue. Já foram registradas 950 entregas em situações de "vida ou morte".
  • Aqui no Brasil, agricultores usam drones para mapear e coletar imagens das plantações, analisar as imagens em tempo real e identificar possíveis problemas que vão desde falta d'água em partes específicas até infestações de pragas não identificadas pelo olho humano. Isso otimiza a aplicação de recursos, como água e agrotóxicos, que agora podem ser aplicados apenas nas partes necessárias.

POTENCIAL ASSUSTADOR
Se os drones podem ser tão benéficos para a sociedade, por que eu teria algum receio sobre eles?
Bem, é simples: uma máquina compacta, que voa, que carrega uma câmera, que pode carregar equipamentos e ferramentas, que identifica movimentos ao seu redor, que se comunica com outras máquinas parecidas com ela e que processa decisões autônomas com inteligência artificial... essa máquina é uma candidata e tanto para protagonizar situações assustadoras. Vou tentar exemplificar com um cenário hipotético, mas perfeitamente real. 

Imagine dezenas de pequenos drones, do tamanho da palma de sua mão, que além de conseguirem voar em sincronia, ainda conseguem:

  • se comunicar entre si;
  • usar sensores para reagir a movimentos humanos;
  • aplicar inteligência artificial para reconhecer rostos, partes do corpo e peças da casa;
  • registrar imagens com câmeras de alta definição;
  • alterar ou capturar objetos do ambiente;
  • carregar substâncias tóxicas ou armas de fogo...
  • e ainda serem controlados por qualquer pessoa com acesso aos controles remotos e a algum software de gerenciamento de drones

Ou, ainda pior: um grupo de drones completamente autônomo, autogerenciado, sem qualquer controle humano! Assustador, não? E tudo possível com a tecnologia que temos hoje. O vídeo a seguir consegue simular um pouco do terror que seria esse cenário catastrófico (se desejar, você pode colocar para funcionar a legenda em português):


Embora o vídeo trace um cenário futuro, já encontramos atualmente diversas aplicações militares de drones autônomos. Os EUA os utilizam há mais de uma década em regiões montanhosas do Afeganistão e em outros países que eles julgam "terroristas". A força aérea israelense usou drones há poucas semanas para jogar gás lacrimogêneo em manifestantes palestinos

Não são só as forças armadas que estão apostando no drone como ferramenta letal. Especialistas do Reino Unido apontam que há grande chance dos drones serem utilizados como ferramenta de terrorismo dentro do território britânico.

Podemos pensar que as aplicações militares estão bem longe de nossas casas, mas o problema é que a polícia também já começa a utilizar drones em ações urbanas. No começo desse mês, uma empresa norte-americana de drones formou uma parceria com uma empresa de inteligência artificial para começar a produção de drones especiais a departamentos de polícia dos EUA. Além da câmera de alta-definição, esses aparelhos devem contar com uma tecnologia inteligente que analisa as cenas gravadas.

Coincidentemente, algumas semanas antes dessa notícia, foi publicada uma pesquisa científica em que uma inteligência artificial analisa cenas de multidões e identifica movimentações violentas de indivíduos. A tecnologia registra movimentações de braços e pernas e compara com movimentações humanas padrões, para então concluir se o movimento foi violento ou não. Já imaginou isso associado aos drones policiais? O problema, no meu ponto de vista, é: devemos mesmo permitir que uma máquina julgue quem é o indivíduo violento por meio de padrões de movimento? Minha outra preocupação é: depois de termos aplicado essa tecnologia, vamos passar para os drones reativos, com capacidade de acionar substâncias ou armas não-letais?

Além do potencial violento e até letal dos drones, outro problema menos agressivo, mas ainda assim preocupante, é a invasão de privacidade. Onde houver uma janela, haverá a chance de um drone intrometido registrar imagens de interiores. E não são apenas os lares de família e os ambientes fechados que correm esse risco: o ataque à privacidade por ir desde praias nudistas até grandes eventos restritos que se sustentam com o acesso pago, tais como shows musicais, eventos esportivos e grandes palestras.

O fato é que os drones estão emergindo como tecnologia extremamente impactante para a sociedade, tanto no sentido benéfico quanto no maléfico. Por isso, é mais que necessário o debate sobre questões éticas e regulamentações governamentais, que já existem e já são aplicadas, mas que precisam ser monitoradas pela sociedade civil.

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